1. |
ALMA/ 01 CLARO
03:13
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CLARO
Claro,
ainda te vejo.
Não sossego,
é suposto.
Guardo
memórias que odeio,
em desespero,
desde que foste.
Parvo,
este desejo
de ser sincero,
é de mau gosto.
Gasto
do que entristece,
sobrevivo
ansioso.
Não é que um dia são semanas,
depois meses, depois anos.
E da minha nuca emana
todo o peso dos teus planos.
É a vida que me escapa
no rasto da tua presença.
Até que o perdão me inunde,
num acesso de consciência.
Claro.
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2. |
ALMA/ 02 UM DIA
03:30
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UM DIA
Não vais sentir a minha falta,
eu vou no foco da aurora.
Eu vou crescer como uma árvore
e não cair como uma folha.
Um dia ser um cosmonauta
e ver o mundo daqui de fora
e acenar à casa-base,
viver uma vida nova.
H2O2.
Não vais sentir a minha falta.
Enquanto emigro, invento a roda.
Eu vou voar como uma ave
e não pairar como uma bolha.
Um dia perco as coordenadas
e só descanso na minha cova.
Escrevo o mundo numa frase.
Grito-o numa língua nova.
H2O2.
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3. |
ALMA/ 03 DOCUMENTOS
03:41
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DOCUMENTOS
Até documentos foram árvores, um dia.
Até ferramentas foram arte, um dia.
Até documentos foram árvores, um dia.
Até ferramentas foram arte, um dia.
Para constar, estou contente com o pouco que me resta.
Se quem cala, consente, então não tenho pressa.
Só com calma e com tempo o corpo regenera.
Será delírio ou pouca sorte?
Uma ninfa que me acuda(!)
E vou parar a qualquer porto - saio onde não há culpa.
Até documentos foram árvores, um dia.
Até ferramentas foram arte, um dia.
Até documentos foram árvores, um dia.
Até ferramentas foram arte, um dia.
Se, ao voltar ao presente, o meu leme se quebra;
Vou gritar contra o vento, neste barco de pedra.
A remar para dentro - se abrandar, ninguém espera.
Não tenho alívio e estou tão farto.
Seguro o mundo de luvas.
E vou parar a qualquer parte - caio onde manda a chuva.
Até documentos foram árvores, um dia.
Até ferramentas foram arte, um dia.
Até documentos foram árvores, um dia.
Até ferramentas foram arte, um dia.
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4. |
ALMA/ 04 CUTA
03:50
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CUTA
Até se eu pondero os teus seios
como busto imperfeito,
é tudo uma questão de contexto.
O "todo" e a "parte",
abordagens de arte.
Ouro e porcelana fundidos,
É tudo uma questão de contraste.
Beleza canónica é um erro,
guarda para ti o segredo.
Remo-te o cabelo contra o vento.
Olhos nos ombros, se te apago o passado.
O teu espanta-espíritos personalizado.
Perfeito é não ser perfeito.
Até se eu invento um pretexto
e arranjo defeito,
é tudo uma questão de conceito.
Ao ver-te calcar o passeio,
Caminhas pelo meio da gente
e sentes que é tudo uma questão de plateia.
Dogma para mim é veneno,
espalho o meu sal no terreno,
cavo o local do enterro.
Madeira, ferro e olhos vendados
O teu crucifixo personalizado.
Perfeito é não ser perfeito.
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5. |
ALMA/ 05 POMAR
03:52
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POMAR
E as vozes doutro baile
entoam uma canção da sua tristeza.
Mesa posta para ninguém jantar.
Se Lisboa fosse pomar,
o campo dividia-se,
e vivia-se
em gomos de incerteza a incubar.
Que tímido barco de símios, é facto.
Serve-me mais um copo de vinho,
que eu não volto a este bar,sabes;
Identifico-me com todos eles.
E as ondas doutro mar
entoam uma canção da sua beleza,
que eu não sei bem como recusar.
Eu sonho em descolar.
E agora a terra abria,
dividia-se
pelo mundo sem grilhetas, a flutuar.
(E eu sei que não vi tudo.)
E eu vou cruzar os braços,
dar as costas.
Saltar,
logo se vê doutras apostas.
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6. |
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CAPITAL, 28-04-19
Enfrento a dor que me enguiçaram,
afogo-me num planeta de erva.
Dispo um bosque a cada trago,
esgoto rápido as reservas.
Numa fuga improvisada,
vou correndo meio às cegas.
E escrevo um mundo feito à pressa.
E escrevo um mundo feito à pressa.
28-04-19,
Dorme-se o sono de quem devora
latas de atum ao natural.
Arestas da mobília que apodrece
fazem-me comichão nos olhos,
artista faminto da capital.
O eco do meu quarto dá vertigens,
e adora.
O eco do meu quarto dá vertigens.
E agora?
E face à dor que me enguiçaram,
isolo-me num planeta de erva.
Como um coelho amestrado,
esgoto rápido as reservas.
Numa jaula aprisionado,
vejo o mundo pela janela.
Neste distanciamento,
galgo paredes em verso.
Banhos em cama ardente,
a ver se estorrico uma peça.
Visto um ar dormente:
creio que o mood é sépia.
Existência-meta-existência-meta.
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7. |
/ATA 01 DEIXA-ME IR
02:25
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DEIXA-ME IR
Deixa-me ir.
Nós não somos uns dos outros
e ainda que fôssemos,
calhava tão bem.
Só mentir
nos afasta uns dos outros
e pouco a pouco,
ficávamos tão sem...
ficávamos tão sem...
O que há de vir
é do domínio dos druidas,
ou doutros magos,
os nomes não sei,
os nomes não sei.
Omitir
não é zelar pelo que cuidas,
é contorná-lo,
e aos outros também.
(deixa-me ir, deixa-me ir)
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8. |
/ATA 02 ESQUISSO
03:00
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ESQUISSO
Estás tão calada, querida.
Traz a tinta da china.
Um esquisso que esboce a linha,
diz-me isso na nossa língua.
Atravessa, comunica.
Com nós de amor nas letras.
De quem é a culpa, vida,
quando as palavras secam?
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9. |
/ATA 03 NÃO MINTAS
03:49
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NÃO MINTAS
Não mintas,
bate a porta.
Olha o sol a querer nascer.
Se me obrigas,
cepa torta.
Ao que eu não quero fazer.
Só não digas,
Só não finjas.
Corta a sina em dois
e nós
dançando
em redor dela.
Aprendi a dançar pela tua mão.
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10. |
/ATA 04 GRAÇA
03:14
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GRAÇA
Fui dar um giro à Graça,
(eu)
para me ouvir pensar.
Em casa, o tédio teima em querer arder.
E eu já não sei como o ocupar.
Vim ver um céu diferente,
lavar a vista em gente…
E sentar-me em silêncio
enquanto o ar renova no meu quarto.
E se a tristeza passa?
Todas as memórias que odeio são preciosas.
Ando o tempo todo
a encontrar-me na minha prosa.
Cobre a mente de molho,
sai tabaco pelas mucosas.
Espalho todo o sal que tenho sem saber a causa.
Como um cão que morde,
sem notar,
a própria cauda.
Todas as memórias que odeio são preciosas.
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11. |
/ATA 05 ALVORADA
03:07
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ALVORADA
Espreitas pela porta, sussurrando.
Esbarras de asa-delta com os meus planos.
Olá, alvorada,
numa orla enevoada,
cá te esperamos.
Sei que a vida é torta,
mas tentamos
dar-lhe sempre a volta,
passam anos.
Olá, alvorada,
numa orla enevoada,
cá te esperamos.
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12. |
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MÃE, NASCI PARA SOFRER
(nada em meu nome)
(...)língua a saber a papel
Se a ansiedade apresentasse o último modelo, era eu.(...)
Fado duro, menino de barro:
Burro a olhar para um castelo.
Se a cidade nomeasse o mais perdido, era eu.
Jazo bruto tipo Baco:
Língua a saber a papel
Se a ansiedade apresentasse o último modelo, era eu.
Surdo, mudo, triste, baço:
O coma é o meu quarto de hotel.
Se esta casa vomitasse o filho do ventre, era eu.
Vago, escuro, hirto, fraco:
Corpo suspenso em cordel.
Se esta voz enfim ecoasse, o fim do mundo era eu.
Faz um arco, aponta longe.
Sinto-me vago, muito amorfo.
Sinto que estrago tudo em que toco.
Gritas alto, fá-lo em sopro.
Cria, cede.
Fome, sede,
acabas entre o ser e o não ser.
Lá veio ao mundo,
pálido e sujo,
filho de um bruxo
que te avisa e teu amigo é.
Tudo aquilo que eu toco morre triste e devagar.
Traço um círculo à minha volta e apodreço quem entrar.
Tenho o toque de merdas.
(nada em meu nome
(...)Lá veio ao mundo,
pálido e sujo,
filho de um bruxo
que te avisa e teu amigo é.)
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